domingo, 9 de janeiro de 2011

O QUE MATA É O SILÊNCIO

O QUE MATA É O SILÊNCIO.


Dessa vez não ia ter nenhum erro, engano ou falha. Ele iria encostar o cano da 3.80 no céu da boca, puxar gatilho e explodir os miolos, simples.

Ele tinha ouvido falar de pessoas que ao tentarem estourar o crânio, não tinham encostado o cano direito e feito a devida força e pressão, e a coisa tinha dado toda errada.

Uma adolescente de 14 anos havia tentado isso; enfiou o cano da arma na boca e atirou. Mas não deu certo, a posição, pressão e força não foram o suficiente para seu objetivo. Como consequência, sua língua tinha virado um farrapo, seus tímpanos estouraram e o seu olho esquerdo ficou sem líquido, quanto ao cérebro, nada.

Ela perdeu a fala, a audição, tem somente 30 % de visão do olho direito. Ela não morreu. Não escreveu um bilhete de despedida se explicando. Agora ela é dependente de seus pais, que se questionam porque ela tentou se matar. Eles não entendem, e ela não pode se explicar, pois sua capacidade de comunicação é mínima.

O que mata mesmo é o silêncio.

Ele não iria fazer uma merda dessas. Havia aprendido com a história da menina.

Talvez fosse bom escrever uma carta, um bilhete, talvez enviar um e-mail, mas para quem? E, também, para que se explicar, ou por que se explicar? Algumas coisas acontecem sem um motivo, para que se justificar o tempo todo?

Boca bem aberta. O cano é frio e tem um gosto de óleo. O cano tem uma extensão longa, e até encostar no céu da boca, um eterno caminho é percorrido.

Ele fecha os olhos e se concentra.

Faz força e pressão no palato; não quer que nada dê errado.

Cria coragem.

Silêncio.

[...um silêncio eterno, atônito, inquebrantável se instala suspendendo o minuto do ato. Um silêncio elongado, mutilado, estranho.]

Som de um revólver sendo engatilhado.

[…]

Então isso é a morte?


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