domingo, 24 de julho de 2011

SUNDAY MORNING

SUNDAY MORNING

Hoje é sábado, amanhã é domingo
Amanhã não gosta de ver ninguém bem
Hoje é que é o dia do presente
O dia é sábado.

VINICIUS DE MORAES in O Dia da Criação.

Acordei cedo, seis e quinze de uma fria manhã de domingo, seria muito gostoso ficar enrolado na cama, debaixo de um edredom quentinho, encaixado na pessoa amada. Mas ela não está. Levantei-me, desci até a entrada do prédio e peguei o meu exemplar da Folha de São Paulo de domingo – Amy Winehouse is dead!

Volto ao apartamento, ao quarto de dormir, a cama ainda aquecida e doída da ausência da minha amada. Abro as cortinas e deixo a claridade do domingo que se anuncia. O dia amanhecia, ´se quebrava´ (adoro a expressão daybreak pra dizer amanhecer. A idéia do dia estar ´se quebrando pra começar um dia é muito poética. Assim como na canção dos Beatles For No One, “Your day breaks, your mind aches, There will be times when all the things she said will fill your head, You won't forget her”; Seu dia nasce, sua mente dói, Haverá um dia em que todas as coisas que ela disse encherão a sua cabeça, Você não conseguirá esquecê-la); iluminando a escuridão do meu quarto de dormir.

Tenho o hábito e prazer me ler jornais assino regularmente a Folha de São Paulo, e nos finais de semana, além da Folha, leio o Estado de São Paulo e O Globo. (Aí você indagaria, por que ler um jornal do Rio se você mora em São Paulo? Bom tem o bairrismo, tem a qualidade dos colunistas cariocas, haja vista os cronistas que escreviam em jornais cariocas – Vinicius de Moraes, Rubem Braga, Clarice Lispector e por aí vai. Mas eu gosto de duas coisas no jornal O Globo, uma delas é um suplemento literário chamado Prosa & Verso que vem aos sábados e a outra é a Revista do Globo que vem aos domingos – isso me basta pra fazer com que eu saia da minha casa e compre o jornal. E ao ler um jornal do Rio, tem o devaneio: devaneio de estar caminhando no calçadão, indo do Arpoador ao Leblon com a brisa marítima a soprar no meu rosto; estar num quiosque em Ipanema a comer empadas e beber um chope; estar sentado no calçadão do Leblon e ver globais, morenas, biquínis, bicicletas, cães, patins, mãos e pernas, coxas e bundas a desfilar...devaneios.)

Volto à cama, enrosco-me no edredom e leio, avidamente e rapidamente, o jornal de domingo. Nada de novo. Nada de bom, mas a leitura é necessária, a leitura é um vício!

Tomo um banho, visto-me e desço mais uma vez pra compar pão e o jornal o Globo.

Moro em Santana (Já morei perto da Paulista, perto dos Jardins, perto do glamour – se é que se pode se chamar de glamour a rua Frei caneca esquina com a Peixoto Gomide; mas cansou! Uma hora tudo cansa! O casamento, amigos, o emprego, os mesmo locais, o barulho, os beijos e abraços, a muvuca de sexta-feira noite, a rua imunda sábado de manhã pós-festa, pós-raves, pós-clube da Louca, pós-balada, pós-apocalipse...pós tudo!

Mudei! Uma hora as mudanças têm que acontecer, senão você pira! E você bem sabe, as mudanças têm o seu preço, está disposto a pagar? Sair de sua zona de conforto? De sua acomodação? Are you willing to do it? Eu lhe digo, vale a pena pagar o preço!)

Ao sair do prédio um vento frio acaricia-me o rosto como uma navalha a rasgar a carne. A rua vazia, os mendigos e desabrigados de sempre vagam a esmo pela rua vaga e silenciosa. A rua abre-se como um caderno com suas páginas em branco prontas pra receber o texto que você vai escrever para o seu domingo.

Compro o jornal numa pequena banca localizada na Voluntários esquina com a Leite Morais e os pães compro uma pequena padaria na esquina da rua onde moro. Invariavelmente está saindo uma fornada nova de pães. Volto ao meu apartamento com um saco com três pães franceses quentinhos, e não há anda melhor do que cortar um pão quentinho, passar manteiga e vê-la derreter, hummmmm....

Volto a casa, preparo um simples breakfast – pão com manteiga e chá de camolmila; e o domingo já se iniciou. Estou só, mas não sozinho e largado no mundo. A vida é o que você faz com ela, com o que ela lhe propicia. Aproveite o seu dia, sozinho, acompanhado, mas aproveite; estar vivo já é uma benção extraordinária! Ame as pequenas coisas, Deus está nos detalhes. Mastigue a água que você bebe, tem algum sabor? Não, mas mata a sua sede.

Um bom domingo e lembre-se, impossível não há.

*Pra quem gosta aí vão os lyrics de For No One dos Beatles e o link do vídeo no You Tube numa interpretação de Caetano Veloso:

http://youtu.be/8g3AZf-d9kM

For No One

Your day breaks, your mind aches,

You find that all her words of kindness linger on,

When she no longer needs you.

She wakes up, she makes up,

She takes her time and doesn't feel she has to hurry,

She no longer needs you.

And in her eyes you see nothing,

No sign of love behind the tears cried for no one,

A love that should have lasted years.

You want her, you need her,

And yet you don't believe her,

When she says her love is dead,

You think she needs you.

And in her eyes you see nothing,

No sign of love behind the tears cried for no one,

A love that should have lasted years.

You stay home, she goes out,

She says that long ago she knew someone but now,

He's gone, she doesn't need him.

Your day breaks, your mind aches,

There will be times when all the things she said will fill your head,

You won't forget her.

And in her eyes you see nothing,

No sign of love behind the tears cried for no one,

A love that should have lasted years.

Para Ninguém

Seu dia nasce, sua mente dói,

Você descobre que todas as coisas gentis que ela disse,

Não fazem mais sentido.

Ela acorda, ela se maquia

Ela não tem pressa,

Ela não precisa mais de você.

E nos olhos dela você não vê nada,

Nenhum sinal de amor atrás das lágrimas choradas por ninguém,

Um amor que devia ter durado anos.

Você a quer, você precisa dela,

No entanto você já não acredita nela

Quando ela diz que seu amor já morreu,

Você pensa que ela precisa de você

E nos olhos dela você não vê nada,

Nenhum sinal de amor atrás das lágrimas choradas por ninguém,

Um amor que devia ter durado anos.

Você fica em casa, ela sai,

Diz que a muito tempo conheceu alguém mas agora

Ele se foi e ela não precisa dele.

Seu dia nasce, sua mente dói,

Haverá um dia em que todas as coisas que ela disse encherão a sua cabeça,

Você não conseguirá esquecê-la.

E nos olhos dela você não vê nada,

Nenhum sinal de amor atrás das lágrimas choradas por ninguém,

Um amor que devia ter durado anos.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

FAZENDO ARROZ

FAZENDO ARROZ

“[...] a obra, no que tem de significativo, é um todo que se explica a si mesmo, como um universo fechado. Este estruturalismo radical [...], é inviável no trabalho prático de interpretar, porque despreza entre outras coisas a dimensão histórica, sem a qual o pensamento contemporâneo não enfrenta de maneira adequada os problemas que preocupam.”

ANTONIO CANDIDO in `Literatura e Sociedade´.

Recentemente me separei pela segunda vez. Acabei com o meu segundo casamento. Sim, pode me execrar, falar mal de mim, exaltar essa instituição chamada casamento (pode não parecer, mas eu acho que casar é uma boa, isso se você achar a pessoa certa e adequada aos seus instintos e manias, mas isso é papo pra outra crônica); falar que tem que se manter a estabilidade de um casal a qualquer custo, que não pensei nos filhos, blá blá blá. Pronto? Falou tudo que queria?

Ok,vamos em frente! Como estava a dizer recentemente me separei e estou vivendo uma vida de solteiro. Aos poucos começo a adquirir minha independência – é nesse ponto que as mulheres, as esposas, mães erram, nessa necessidade matriarcal de criar homens dependentes da figura feminina. Não sei se algo feito intuitivamente ou de propósito, ou seja, para dominar mesmo o sujeito, tê-lo sob seus pés ou como já ouvi por aí: ´comendo na minha mão!´.

Bom, cada um, cada um. Se as pessoas acham que amor se confunde com posse e dominação, fazer o que, né? Mas depois não venha me reclamar que seu marido é um bebê chorão, um mandão, que não faz nada sem a sua presença, e quando você quer que ele lhe acompanhe em algum programa, tem jogo do Corinthians na TV e ele não pode perder.

Pessoas são diferentes. Tem gostos, ideologias, vontades, desejos, aspirações e necessidades que são pessoais, de cada um. Não adianta impor sua vontade, não adianta querer mandar no ego do outro, porque uma hora ele vai escapar, como areia por entre seus dedos. Independência entre os membros de um casal é saudável.

Eu, nesse novo momento de minha vida, estou adquirindo pouco a pouco a minha independência. Fui casado durante dez (!?) anos com uma mulher dominadora, castradora que não permitia que me aventurasse nos afazeres domésticos. Eu achava que nunca conseguiria fritar aipim ou lavar uma camisa de tão intrincado que o processo se mostrava pra mim. Agora, dentre as personas que em mim habitam, estou deixando aflorar mais uma, ´dono de casa´.

Lavo e passo minhas camisetas, camisas, calças, cuecas, toalhas, roupa de cama; vou à feira compro tomates, batatas, ovos, cenouras, couve-flor, cebola, alho, tangerinas, maças e encerro o tour com um pastel, em pé, na barraca do japonês. Estou aprendendo a cozinhar – descobrir sem pressões ou cobranças esta nova faceta em mim está sendo bom, está sendo terapêutico. Saber que você é capaz de sempre se reinventar é um sinal da capacidade que o ser humano tem de superar a si próprio e as suas expectativas.

Por enquanto minhas aventuras na culinária se resumem ao trivial – ouvi dizer que ao conseguir fazer um arroz e um feijão caprichados, você está habilitado a alçar voos mais altos e audazes.

Posso fritar um aipim, fazer um pastel de queijo, montar uma bela salada, temperar e fritar um bom filé de frango, mas havia algo que demorei a acertar, arroz. Das coisas simples de se fazer na culinária, fazer arroz mostrava ser, ao menos pra mim, algo simples e complicado ao mesmo tempo. Fazer arroz é simples:

1°) Pegar um dente de alho e esmigalhar, com casca e tudo, com o cabo de uma faca, coisa de macho!;

2°) Esquentar um pouco de óleo numa pequena panela, jogar o alho esmigalhado e deixar dourar. Retirar o alho, como dizem os mineiros, ´casca o aí, quenta o ói, joga o ái no ói!´;

3°) A medida de arroz pra uma pessoa é um copo, de água são dois copos e meio;

4°) Enquanto você está esmigalhando o alho, colocando o óleo pra esquentar, dourando et cetera et al; esquente no microondas a medida de água por uns 4 minutos;

5°) Pegue a medida de arroz e coloque no óleo onde você dourou o alho. Misture e coloque sal a gosto – experimente a água pra ver se está bom de sal. Tampe e deixe secar a água.

Simples, não?

Pois o primata aqui queimou três ou quatro panelas de arroz, colocou sal demais, óleo demais, até que consegui! Fiz um arroz decente.

Para quem está acostumado a cozinhar pode até dizer, e daí? E daí, nada; mas para quem está em busca de sua independência, de sua liberdade; em busca de um novo caminho na vida, é tudo!

Não pense que a vida é algo hermético, um universo fechado a toda e qualquer mudança. A vida tem esse conceito de organicidade, de ser um organismo vivo que reage aos fatores externos que a condicionam e motivam.

O caminho para felicidade é simples. Aceite o novo, aceite que a sua vida pode mudar. Abrace as oportunidades que surgirem em seu caminho. Não se apegue as coisas materiais, porque no fim é só dinheiro – it´s just money. Mergulhe dentro de si, dentro do seu ego, do seu interior e caia sem redes de segurança. Tenha paciência consigo mesmo, tudo leva tempo e tudo a seu tempo.

Ser feliz, às vezes, pode ser tão simples como se fazer um bom arroz.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Poema ´Cold´ da poeta escocesa Carol Ann-Duffy

Caros,

Venho lhe apresentar a poeta escocesa Carol Ann-Duffy. Duffy esteve presente na ultima Festa Literária de Paraty – Flip, onde leu poemas de sua autoria, mas passou quase despercebida da grande multidão e dos olhos da mídia, talvez por ser uma poeta e não uma romancista ou pop star, a autora passou ao largo dos holofotes da mídia.

Duffy é poeta laureada (ela escreveu o poema Achilles¹ sobre a lesão do tendão do jogador de futebol David Beckham que o deixou de fora da Copa do Mundo de 2010 e um poema de 46 linhas Rings² para o casamento do príncipe William e Kate Middleton) e tem os seus poemas lidos nas escolas britânicas.

Sempre tentando reviver a poesia que existe dentro de vocês, dentro desse cotidiano massificante, de quando em quando vou postar aqui poemas de autores contemporâneos. Leiam o poema Cold de Carol Ann-Duffy com uma tradução livre minha.

Boa leitura!

COLD

It felt so cold, the snowball which wept in my hands,

and when I rolled it along in the snow, it grew

till I could sit on it, looking back at the house,

where it was cold when I woke in my room, the windows

blind with ice, my breathing undressing itself on the air.

Cold, too, embracing the torso of snow which I lifted up

in my arms to build a snowman, my toes, burning cold

in my winter boots; my mother´s voice calling me in

from the cold. And her hands were cold from peeling

then dipping potatoes into a bowl, stopping to cup

her daughter´s face, a kiss for both cold cheeks, my cold nose.

But nothing so cold as the February night I opened the door

in the Chapel of Rest where my mother lay, neither young, nor old,

where my lips, returning her kiss to her brow, knew the meaning of cold.

CAROL ANN-DUFFY, poeta escocesa.

FRIO

Estava tão frio, a bola de neve derretia em lágrimas em minhas mãos,

e quando a rolei pela neve, ela cresceu

até que eu pudesse me sentar em cima dela e olhar para a casa lá atrás,

onde estava frio quando eu acordei no meu quarto, as janelas

embaçadas pelo gelo, que minha respiração despia com o ar.

Frio ao abraçar o torso de neve que levantei com os meus braços

para construir um boneco de neve, os dedos do meu pé queimando de frio

dentro das minhas botas de inverno; a voz de minha mãe

me chamando para entrar e sair do frio. E as mãos dela estavam frias de descascar batatas

e depois colocá-las em uma tigela, parando de quando em quando

para acariciar o rosto de sua filha e beijar as duas bochechas frias, meu nariz frio.

Mas nada tão frio quanto aquela noite em fevereiro que eu abri a porta

da capela do velório de minha mãe, ela não estava mais jovem, nem idosa,

Sua sobrancelha onde meus lábios retribuíram seu beijo, conhecendo enfim o significado do frio.

*tradução livre Alexandre de Almeida

1. ACHILLES

Myth's river - where his mother dipped him, fished him, a slippery golden boy flowed on, his name on its lips.

Without him, it was prophesied, they would not take Troy.

Women hid him, concealed him in girls' sarongs; days of sweetmeats, spices, silver songs...

But when Odysseus came, with an athlete's build, a sword and a shield, he followed him to the battlefield, the crowd's roar,

And it was sport, not war, his charmed foot on the ball...

But then his heel, his heel, his heel...

2. RINGS

I might have raised your hand to the sky
to give you the ring surrounding the moon
or looked to twin the rings of your eyes
with mine
or added a ring to the rings of a tree
by forming a handheld circle with you, thee,
or walked with you
where a ring of church-bells,
looped the fields,
or kissed a lipstick ring on your cheek,
a pressed flower,
or met with you
in the ring of an hour,
and another hour . . .
I might
have opened your palm to the weather, turned, turned,
till your fingers were ringed in rain
or held you close,
they were playing our song,
in the ring of a slow dance
or carved our names
in the rough ring of a heart
or heard the ring of an owl's hoot
as we headed home in the dark
or the ring, first thing,
of chorussing birds
waking the house
or given the ring of a boat, rowing the lake,
or the ring of swans, monogamous, two,
or the watery rings made by the fish
as they leaped and splashed
or the ring of the sun's reflection there . . .
I might have tied
a blade of grass,
a green ring for your finger,
or told you the ring of a sonnet by heart
or brought you a lichen ring,
found on a warm wall,
or given a ring of ice in winter
or in the snow
sung with you the five gold rings of a carol
or stolen a ring of your hair
or whispered the word in your ear
that brought us here,
where nothing and no one is wrong,
and therefore I give you this ring.

*Leia também o artigo publicado pelo caderno literário Prosa & Verso que é publicado na edição de sábado do jornal O Globo: http://oglobo.globo.com/blogs/prosa/